19 de agosto de 2016

O fascínio inebriante do fogo

QUATRO CÍRCULOS ELEMENTARES

Günther Zainer, De responsione mundi et de astrorum ordinatione, 1472

[Biblioteki Książąt Czartoryskic]

O quarto elemento...

dezanove séculos e meio que Nero (37-68 EC) carrega o ónus de ter mandado incendiar Roma (64 EC) para depois construir um complexo palácio à sua medida e semelhança. Um dos grandes difusores deste ato tresloucado terá sido Suetónio, que o regista nas páginas d' As vidas dos doze Césares (121 EC). Calúnia do biógrafo que não morria de amores pelo imperador. As culpas foram atribuídas oficialmente aos Cristãos, muito embora se tenha devido com probabilidade a um infeliz acidente. O fogo terá começado num moradia de madeira que o vento terá feito alastrar às demais.

O fascínio pelas chamas é uma constante que tem acompanhado o percurso do homem ao longo da sua travessia milenar dos tempos. A descoberta dos mecanismos mecânicos para as produzir levou-o à tentação do fogo posto. Observá-lo de longe como o bisneto de Augusto terá feito enquanto tocava lira e declamava um dos seus poemas. As pinturas e romances têm propagado à exaustão esta recriação da realidade. O cinema tem-se aproveitado do filão para nos apresentar em tamanho gigante os grandes incêndios mais famosos e devastadores da história sempre com êxito de bilheteira.

Nos dias que correm, os jornais enchem-se de fotos de matas e casa-rios do país envoltos pelas labaredas infernais. As televisões abrem os noticiários com estas cenas dantescas repetidas todos os verões. As causas naturais rivalizam com as criminosas. Dos quatro círculos elementares descritos pelos filósofos pré-socráticos, as imagens destinadas à exposição mediática centram-se sempre no quarto. O mais divino. Nem as cinzas da terra queimada, nem a transparência da água derramada, nem a opacidade do ar irrespirável conseguem rivalizar com o vermelho devorador do fogo apocalíptico.

No rescaldo do grande incêndio de Roma, Nero reergueu a cidade imperial a expensas da sua fortuna pessoal. Segundo garante Tácito no Livro XIII dos Anais (c. 68 EC). Terá ainda aberto as portas do seu palácio aos desalojados e criado um fundo para custear os alimentos dos sobreviventes. Bom exemplo para ser seguido entre nós passados os dezanove século e meio referidos. Enviar os incendiários para avaliação psiquiátrica e reordenar uma vez por todas o território atingido pelo flagelo sazonal. Depois convencer os mass media à moderação informativa. Sairíamos todos a ganhar.

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