Pablo Picasso - Les demoiselles d'Avignon - 1907[Museum of Modern Art - New York] |
CULTURA & NATURA
Como um metteur en scène severo e caprichoso, Paulo Piconegro submete as suas putas a um rigoroso método de seleção, indiferente a qualquer escrúpulo. Nunca contrata uma mulher sem tê-la experimentado antes, mas procede ao exame com fastio e apenas depois de ter feito perguntas sobre a arte e o assombro, sobre a vertigem da arte, a sua minúcia esmagadora e os seus abismos. Instala a cadeira de roda de costas para Les demoiselles d'Avignon e faz com que as raparigas se sentem diante da enorme reprodução, do seu Picasso de fancaria, e fala-lhes de música e teatro, de pintura e dança, da literatura e do sublime do entardecer nas montanhas, do fragmento de explosão e de caos que há em todos os poentes. Diz-lhes que não tenham medo, que não há motivo nenhum para não terem medo, e pede-lhes que falem um pouco disso, de como é o crepúsculo e o rumor dos regatos no sítio de onde vêm, como são as histórias que lá se contam. A arte é a forma mais sublime da natureza, murmura. Ou vice-versa. A natureza é a mais sublime forma de arte, Repete. Paulo Piconegro num tom de voz apaziguador e quase cúmplice. Parece amistoso apesar do olhar frio que tem, de milhafre. Procura sossegar as mulheres e incita-as a expressarem-se à vontade. Como se eu fosse o teu pai, o teu avô, um tio de que gostes muito, diz-lhes. E esconde um sorriso gelado e sinistro - um sorriso de raposa.
Manuel Jorge Marmelo, Macaco infinito (2016: 25)
Ontem há noite estive a ler uma crítica sobre esta mesma obra, na revista do Expresso. Muito interessante. Se bem me lembro o crítico era o José Mario Silva.
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