THOMAS WRIOTHESLEY Henry VIII jousting in front of Catherine of Aragon in 1511 |
Le Chevalier du Cœur Loyal
«Não descobrirás a nudez da mulher do teu irmão: é a nudez do teu próprio irmão [...] Se um homem tomar a mulher do irmão, isso é uma impureza; porque descobriu a nudez do seu irmão, morrerão sem filhos.»LEVÍTICO: 18, 16; 20, 21
Henrique VIII (1491-1547) gostava de colecionar de tudo um pouco: títulos, estilos, emblemas, brasões, divisas, amantes e mulheres, as suas e as alheias, católicas e luteranas, anglicanas e protestantes, casadas e solteiras. Só não conseguiu ter uma ranchada de filhos varões como desejava mas bem ensaiou. Sobreviveu-lhe um mas foi sol de pouca dura. A Eduardo VI, sucederam-lhe uma prima e duas filhas: Jane Grey, a Rainha dos Nove Dias; Maria I, a Sanguinária; e Isabel I, a Gloriana. Ironias dum destino indesejado com contornos trágicos ou dramáticos ou simplesmente tragicómicos.
Henrique Oitavo, pela Graça de Deus, Rei da Inglaterra, França e Ir-landa, Defensor da Fé e Chefe Supremo na Terra das Igrejas da In-glaterra e Irlanda casou-se seis vezes mas só enviuvou legalmente uma. Anulou quatro casamentos e não sobreviveu à última. Para tal recorreu a uma separação litigiosa por questões religiosas e outra de mútuo acordo por antipatia sensual recíproca, mandou degolar duas delas na Torre de Londres por aludidos atos de traição, adultério e incesto, mas já não teve tempo de eliminar a última por uma qualquer desculpa esfarrapada arranjada à última hora.
O Oitavo Henrique de nome na lista de monarcas britânicos usou como insígnias pessoais, desde os seus tempos de mero Duque de Iorque e de Príncipe de Gales, as três Flores-de-Lis gaulesas e os três Leopardos Normandos. Depois, foi-lhe acrescentando outros atributos reais à medida que foi assumindo as rédeas do poder: a Rosa e a Portcullis Coroadas dos Tudor, usadas desde o tempo do fundador da dinastia, ladeadas pelo Galgo de Richmond e o Dragão Vermelho de Cadwaladr, símbolos heráldicos clássicos da honra e legitimidade da casa reinante e da tradição lendária arturiana.
Henry VIII, the king, para além dos obrigatórios Dieu et mon Droit e do Honi soit qui mal y pense, motes retirados das ordens do Tosão de Ouro e da Jarreteira, e do Altera Securitas associado às grades da Porta Levadiça dos Beaufort, adotou ainda um emblema bordado a ouro nas roupas de aparato e armas de lide que levava para as justas de cavalaria, subordinado ao lema Cœur Loyal (= Coração Leal), o que dado o seu historial matrimonial não deixa de ser irónico, embora se diga que esta divisa se dedicasse em exclusivo a Catarina de Aragão, com quem viveu quase um quarto de século.
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Os escrúpulos sentidos de Henrique VIII por ter casado com a viúva do irmão Artur de Gales, não se manifestaram um só momento ao casar-se com Ana Bolena, depois de ter descoberto a nudez da irmã Maria Bolena. É que os preceitos do Levítico só se aplicavam de modo estrito aos homens. Mais tolerante terá sido Dom Pedro II, ao desposar Dona Maria Francisca Isabel de Saboia, a viúva do irmão Dom Afonso VI. Neste ponto de incestos reais, parece que os Bragan-ças portugueses tinham uma leitura bíblica bem mais terra-a-terra do que os Tudors ingleses seus antepassados remotos.
The procession with Henry at its heart |
Belo texto histórico, Prof! É inconcebível como os homens inventam sistemas para exercer o seu poder sobre os seus semelhantes, de forma a decidir da sua vida e morte e dos recursos que a todos deveriam pertencer. O absolutismo é um deles, sendo impressionante o poder concentrado nas mãos de um só homem...
ResponderEliminarO mais poderoso monarca britânico de todos os tempos, dizem os anais, mas provavelmente também o mais insatisfeito para não dizer infeliz.
ResponderEliminarAdorei, como sempre! Esta tua veia para contar episódios da corte, entre muitos outros, é reveladora de uma grande maestria nesta lides!
ResponderEliminarSó tu para nos trazeres estas coisas, Artur ��. E para as contar tão bem
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