12 de setembro de 2023

Bordões, narizes-de-cera, sentenças de almanaque, rifões e provérbios avulsos

Magritte – Le pépé à la canne (1937)
bordão
Palavra ou locução esvaziada de sentido e sem função morfossintática, que se usa ou repete no discurso, geralmente de forma inconsciente ou automática, por vezes como forma de apoio em momentos de hesitação, esquecimento ou reformulação do pensamento.
TRANSFIGURAÇÕES
Diga-me cá, os outros sinais, também levam nomes latinos, como deleatur, Se os levam, ou levaram, não sei, não estou habilitado, talvez fossem tão difíceis de pronunciar que se perderam, Na noite dos tempos, desculpar-me-á se o contradigo, mas eu não empregaria a frase, Calculo que por ser lugar-comum, Nanja por isso, os lugares-comuns, as frases feitas, os bordões, os narizes-de-cera, as sentenças de almanaque, os rifões e provérbios, tudo pode aparecer como novidade, a questão está em saber manejar adequadamente as palavras que esteja antes e depois, Então por que não diria você noite dos tempos, Porque os tempos deixaram de ser noite de mesmos quando as pessoas co-meçaram a escrever, ou a emendar, torno a dizer, que é obra doutro requinte e outra transfiguração...
José Saramago, História do cerco de Lisboa (Lx: Caminho, 1989: 13)

BENGALAS, BENGALÕES & CAJADOS

Saramago centra-se numa única palavra de raiz latina e enquadra-a na categoria dos lugares-comuns, das frases-feitas, dos bordões, dos narizes-de-cera, das sentenças de almanaque, dos rifões e dos provérbios. Insere-a na órbita restrita da revisão tipográfica dum livro de história contado segundo as regras teóricas da ucronia. Gosto de imaginar os textos magníficos a que conseguiria dar corpo com as bengalas, bengalões e cajados mediáticos vigentes hoje em diaSó de pensá-lo já sinto um arrepio ao lembrar-me da sua partida há quase três décadas e meia. Fiquem então e agora o efetivamente e o por um lado e por outro lado como uma mera amostragem dos atuais clichés da moda, sendo que muitos outros,  estáexistem a dar com um pau e ao virar da esquina.

1 comentário:

  1. A veia analítica de Saramago tão bem lembrada... Um autodidata que continuará a dar-nos lições sobre as idiossincrasias humanas, em todas as suas vertentes...

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