
I'm not a horse, I'm not an animal, I'm a man...
A L T E R I D A D E S
Anda por aí disponível na Net um filme que eu vi nos anos 70, já não me recordo muito bem onde, mas cuja memória me acompanhou até hoje, apesar de nunca mais o ter voltado a visionar desde então no grande ecrã. Revi-o agora em formato pequeno num canal da TV Cabo, o Star Movies 92 da NOS, no meu plasma caseiro. Espero que se mantenha disponível nos próximos tempos, sobretudo por tratar dum conjunto de tópicos tão atuais nos nossos dias, ligados ao embate de culturas oriundas de espaços geográficos diametralmente opostos e a aversão visceral duns e doutros aos distintos sistemas civilizacionais em confronto. Estou-me a referir a A Man Called Horse (1970), uma película estadunidense realizada por Elliot Silverstein, baseado no conto de Dorothy M. Johnson, Indian Country (1968).
Nas décadas anteriores, os westerns clássicos exibidos nos cinemas ou emitidos na televisão primavam pelas lutas ferozes entre índios e cowboys, quer dizer, entre os corajosos vaqueiros americanos e os ferozes indígenas emplumados. A completar esse estado bélico constante contado com imagens em movimento havia, ainda, toda uma gama de histórias aos quadradinhos, em que os colts certeiros dos bons derrotavam sem exceção os arcos e flechas dos maus. Ou seja, naquele mundo exótico do Far West mítico, os caras-pálidas levavam sempre a melhor sobre os peles-vermelhas. As aventuras infindas do Kansas Kid, do Roy Rogers, do Buffalo Bill contra o Touro Sentado, o Nuvem Vermelha, o Cavalo Louco preenchiam o nosso imaginário infantil a contaminar largamente o juvenil e até adulto.
O homem a quem chamaram cavalo veio dizer-nos que o ser-se diferente não nos faz, a priori, nem bons nem maus. Tudo depende de se cumprirem ou não as regras estabelecidas por cada um dos grupos em presença. Neste caso concreto, entre um representante singular dos invasores ingleses e uma tribo inteira dos invadidos Sioux. O contacto abrupto e o convívio forçado dum europeu nunca até então visto leva a tribo americana que o arrestou a considerá-lo como um mero animal, sem o menor traço de humanidade claro à flor da pele. Tanto para o cativo como para os cativadores, a lei da alteridade considera o outro, individual/coletivo, como um selvagem, cruel e bárbaro. Estão todos errados, afinal. Os padrões é que variam, ou seja, os plasmados na tela e os visionados pelos espetadores.
No ano em que este filme estreou, estavam ainda em cartaz dois outros de temática afim: The Royal Hunt of the Sun (1969) e o Soldier Blue (1970), de Irving Lerner e Ralph Nelson. Sobre o mais antigo, já falei um pouco aqui, o que farei certamente acerca do mais recente, quando voltar a revê-lo numa qualquer estação televisiva. Com três idas ao cinema em menos dum ano, todos os mitos e contramito ligados à conquista do Novo Mundo pelo Velho partiram à desfilada para o país distante do nunca mais. Para tal terá contribuído também o desconforto de ter seguido todos os debates verbais travados na tribo ameríndia em sioux sem legendas auxiliares, pondo-me assim na pele das minorias que são confrontadas com uma língua estranha como se fosse de facto a sua. Tão simples e tão eficiente, em suma.
Já não me lembro do filme e espero ter a sorte de ainda o visionar numa repetição da NOS...
ResponderEliminarA tua recensão é uma visão bem humana deste mundo e seria bom que as pessoas refletissem sobre o que é ser diferente e aprendessem a respeitar o seu próximo. Utopia será, mas convém não perder a esperança...
As utopias nos nossos dias estão literalmente fora de moda, estão precisamente relegadas para um não-espaço e um não-tempo absolutos, povoando cada vez menos o nosso imaginário. Ouço as notícias do dia a dia e só visualizo as distopias clássicas que proliferaram largamente no decorrer do século passado e que, nalguns casos, já começaram a instalar-se com caráter permanente no atual...
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