Praia, mar & dunas |
O mar enrola n'areia...
Às 8:00h da manhã, não se vê vivalma na praia. O extenso areal a perder de vista só é visitado por bandos dispersos de gaivotas que qualquer ruído inesperado faz esvoaçar em todas as direções. Ao meu redor, descansam em espaços restritos as espreguiçadeiras e toldos de aluguer completamente vazios. Virado de costas para as dunas definidoras da linha de costa, dirijo o olhar para o movimento constante das vagas a marcarem as fases altas e baixas das marés com as fileiras de espuma branca da rebentação das vagas, a balizarem as fronteiras oscilantes da borda-d'água.
Pouco a pouco, os grupos de veraneantes começam a semear o território que consideram seu com chapéus-de-sol coloridos, toalhas de praia, cadeiras desdobráveis, para-ventos funcionais e mil e um objetos usuais à beira-mar. Uma fauna exótica, chamaria a minha amiga Aida a estes sedentos de novos territórios a conquistar. Amiga é uma força de expressão, que se aplica à falta de melhor a quem conhecemos medianamente, como é o caso, que apesar de nada e criada em Faro, se converteu ao linguajar afetado de Cascais quando se instalou de armas e bagagens em Algés.
O mar enrola na areia como dizia a canção, as crianças chapinham na água aquecida pelo sol, as horas fluem sem pressa num ambiente de canícula abrasadora. Efeitos evidentes do tal aquecimento global de que tanto se fala e tão pouco se faz. Os banhos, braçadas e mergulhos revigorantes sucedem-se sem pausas de permeio. Os vendedores de bolas-de-berlim passam e repassam em ambas as direções, barlavento-sotavento a um ritmo alucinante. De quando em quando regalo-me com uma recheada de creme pasteleiro. Aperitivo a antecipar uma refeição saudável e ligeira ao almoço.
Entre o meio-dia e o meio-da-tarde os invasores mais resistentes mudam-se para a água a afogar os raios ultravioletas que, mesmo ao abrigo da floresta de sombrinhas coloridas, teimam a grelhar quem lhes fizer frente. Do lanche para a frente, o acampamento dum dia de praia e mar começa a esvaziar-se muito lentamente. O vasto areal entre as dunas raianas e o vasto oceano ficam as marcas visíveis duma ocupação intensa de doze horas solares seguidas. Castelos de areia fugazmente erguidos que as marés noturnas reduzirão fatalmente aos miúdos grãos de que são feitos.
Um ritual que há muito deixei de realizar... Fico abismada quando vejo o pessoal passar o dia assim na praia, mesmo com crianças. Quem diria que uma africana como eu, nada e criada em Cabo Verde, onde vivi até aos 14 anos, fugiria aos poucos à exposição dos efeitos solares, diretos e indiretos, pois a pele assim o exigiu? Nos últimos anos, habituei-me a uma esplanada abrigada do sol e a umas escassas horas junto ao mar de cada vez, intervalando com horas de descanso em paredes interiores quando de férias. As mudanças climáticas assim o exige, já que a pele tem memória...
ResponderEliminarUma memória muito forte que nos nossos verdes anos nem supúnhamos que um dia se viria a manifestar.
EliminarSaborosa resenha.
ResponderEliminarEm pequenos, sem viatura própria, mãe e filhos tomavam a carreira 50 até Algés, seguia-se o comboio, antes de 74, até à praia de Cascais, de manhã praia, piquenique na mata adjacente e depois de uma sexta, fazia-se o percurso inverso. Grande coragem de minha mãe…
Depois de 74, ficávamos-nos pela praia de Sto. Amaro de Oeiras.
Constituída a própria família, o destino de praia passou a ser a praia de Galapinhos, na Arrábida, o piquenique seria convertido em churrasco na mata próxima.
Aqui na ilha, tudo muito mais perto, o almoço leve seria já em casa.
Conclusão: nunca cultivamos um dia inteiro na praia.