«O caos é uma ordem por decifrar. Livro dos contrários»
José Saramago, O homem duplicado (2002)
Um zapping rotineiro pelas três centenas e picos de canais da televisão por cabo levou-me até ao TVC1 50. No curto espaço dum flash permitido pelo saltitar apressado de proposta em proposta, deparei-me com uma grande aranha a ser esmagada por uma mulher num ambiente de cabaret. Achei a cena particularmente bizarra e recuei um pouco na gravação para visualizar o início do filme. O genérico informou-me tratar-se duma adaptação cinema-tográfica dum dos mais estranhos e tardios romances de José Saramago, O homem duplicado (2002), protagonizada por Jake Gyllenhaal. A liberdade criativa do realizador canadiano Denis Villeneuve permitira-lhe retocar um pouco o texto do Nobel portu-guês e intitular o resultado final de Enemy (2013). Vá-se lá saber porquê. Escuso-me a resumir o argumento das duas versões, com a indicação da fidelidade/divergência entre o realismo mágico da diégesis e a expectativa psicológica do thriller. Deixo também em paz a interpretação simbólica da enigmática tarântula, que voltará a marcar presença no final da película. Teias que o destino teceu no ecrã e os cartazes publicitários gravaram para a eternidade.
As ordens por decifrar do homem duplicado da fábula pode ser explicada através das teorias do caos e das probabilidades. O diálogo entre as letras e os números é-nos fornecida pelo narrador da história escrita, quando afirma que em subtilezas e matizes a literatura é quase como a matemática. Lá terá as suas razões que as histórias contadas fora dos livros por vezes se encarregam de confirmar. Vem a talho de foice recordar que no início da década de 70 me confrontei com a representação dum sósia meu numa das páginas das Selecções do Readers Digest. A semelhança foi notada por uma amiga que me ofereceu a revista. Na altura achei curiosa a coincidência e guardei o exemplar num local seguro. Acabei por me esquecer do episódio e perdi o paradeiro da foto. E assim se foi a imagem cristalizada dum tempo em que me vestia de branco, usava o cabelo pelos ombros, me sentava no chão e andava de pé descalço. Um dia destes ainda me cruzo por aí com o meu duplicado. Acasos possíveis com que o dia-a-dia nos surpreende para mostrar um pouco da sua graça e criar a ilusão de que a nossa vida dava um filme e cabia nas páginas dum romance.
As ordens por decifrar do homem duplicado da fábula pode ser explicada através das teorias do caos e das probabilidades. O diálogo entre as letras e os números é-nos fornecida pelo narrador da história escrita, quando afirma que em subtilezas e matizes a literatura é quase como a matemática. Lá terá as suas razões que as histórias contadas fora dos livros por vezes se encarregam de confirmar. Vem a talho de foice recordar que no início da década de 70 me confrontei com a representação dum sósia meu numa das páginas das Selecções do Readers Digest. A semelhança foi notada por uma amiga que me ofereceu a revista. Na altura achei curiosa a coincidência e guardei o exemplar num local seguro. Acabei por me esquecer do episódio e perdi o paradeiro da foto. E assim se foi a imagem cristalizada dum tempo em que me vestia de branco, usava o cabelo pelos ombros, me sentava no chão e andava de pé descalço. Um dia destes ainda me cruzo por aí com o meu duplicado. Acasos possíveis com que o dia-a-dia nos surpreende para mostrar um pouco da sua graça e criar a ilusão de que a nossa vida dava um filme e cabia nas páginas dum romance.
Gostei do filme. Do livro também tinha gostado. Teias que nos prendem. Gosto da metáfora (... Mas a aranha era dispensável... Vá, aceita-se, com relutância)
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