1 de outubro de 2015

Dedo para cima

Marion Peck, Fuck You (2008)

Uma imagem vale bem mais do que mil palavras. A frase é atri-buída ao filósofo chinês Confúcio, depois repetida em todas as lín-guas. A do dedo médio virado para cima dispensa qualquer tipo de verbalização. Se se tratar duma senhora, o espanto surge e a ar-ticulação duma cadeia fonética com sentido ganha uma dificuldade acrescida. Na melhor das hipóteses, converte-se num semissorriso irónico de cumplicidade implícita ou desfaz-se numa gargalhada es-tridente de aquiescência explícita. O beliscar inusitado do expec-tável provoca sempre uma reação de riso mais ou menos contido.

Pegar numa chávena de chá com o mindinho esticado, luzir um anel de brilhantes no seu-vizinho, compor um V com o pai-de-todos e o fura-bolos, erguer o mata-piolhos para confirmar a vitória, são algumas possibilidades estéticas admissíveis no retrato pintado por Marion Peck. A simbologia do gesto gravado na tela remete-nos para as palavras que a autora associou no título da obra. A primeira começa por F e costuma ser seguida por três *** de pudor, tantos quantos as letras elididas. Em português soa a faca, vocábulo acutilante e perfeitamente aceitável pelos ouvidos mais discretos.

Aproveito o gesto descontraído desenhado a duas dimensões em estilo império e dirijo este dedo iconoclasta a todos os filhos-da-mãe da nossa praça, aos vendilhões do templo e charlatães da banha-da-cobra, aos arautos da desgraça, fazedores-de-mitos e línguas-de-palmo, aos vira-casacas, chicos-espertos e lambe-botas, aos cara-de-pau e paus-mandados do burgo. A todos os peritos na lavagem-de-cérebro, milagreiros sazonais de trazer-por-casa, pregoeiros do mais-do-mesmo eternizado, levanto o dedo bem para cima e afino o olhar, pois uma imagem vale bem mais do que mil palavras.

2 comentários:

  1. E com sábias palavras salientas o gesto que estes filhos da mãe (pobre senhora que é sempre metida ao barulho) merecem ver em cada mão que atraiçoaram. Levante-se o país todo com o dedo médio em riste|!

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  2. E o país não levantou o dedo médio em riste quando teve oportunidade de fazê-lo. Baixou a mão e deixou-se ficar sentado à espera que a boa sina lhe caia um dia em cima sem ter de mexer uma palha...

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