28 de junho de 2018

María Dolores Pradera: toda una vida...

Ouvi pela primeira vez uma das mais entrañables vozes da canção hispânica em meados da década de 70. Encontrava-me então a passar férias de verão em casa duns amigos meus extremeños que conhecera no final dos anos 60. Enquanto arrumávamos a mesa da sala dum pequeno almoço tardio ou a preparávamos para uma qualquer outra refeição da tarde, ligámos a televisão. No ecrã surgiu a mira técnica da RTVE pintada ainda a preto e branco. O silêncio foi quebrado pelas palavras cantadas por María Dolores Pradera: Amanecí otra vez entre tus brazos...

Foi amor à primeira vista, de tiro e queda, um flechazo. A voz sem rosto que ouvi nesse entardecer de agosto ficou gravada na minha memória até hoje. Voltei ao seu convívio através dos registos em vinil, cassete, CD e vídeo. Boleros, rancheras, corridos, milongas, habaneras, coplas, pasodobles, zambas, fados. a vira na RTP sem saber quem era e com a voz dobrada na Inês de Castro (1944) de Leitão de Barros. Encarnava o papel de D. Constanza Manuel, a rainha consorte repudiada de Castela e princesa mal-amada de Portugal. Cómo han pasado los años...

E a voz sem rosto da cantiga juntou-se ao rosto sem voz do filme e formou um todo que me acompanhou ano após ano, década após década. Ininterruptamente. Sem vacilar. E das rádios e das televisões, e dos discos e dos palcos, passou decididamente para a blogosfera. Invadiu a Net. Tem um lugar destacado no YouTube. Rendeu-se às redes sociais e ganhou uma página no Facebook. Partiu sem regresso aos 93 anos sem dizer adeus. Soube-o através dos canais à dimensão global deste nosso mundo virtual. Deixou-nos a voz e o rosto na memória. Toda una vida...

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