Reis, Damas / Rainhas, Valetes & Jokers    
Desde o já longínquo dia 23 de maio de 1179, data em que o Papa
 Alexandre
 III
 assinou
 a bula
 Manifestis Probatum a reconhecer D
. Afonso
 Henriques
 como
 primeiro
 Rei
 de
 Portugal,
 sucederam-lhe
 no
 trono
 34
 monarcas,
 entre
 os
 quais
 duas
 rainhas
. Tiveram
 esses
 herdeiros do 
Fundador as
 suas
 caras-metades, que receberam a designação de Consortes, sem qualquer papel de relevo na ação governativa e vivendo em grande parte à sombra da Casa das Rainhas,
 fonte
 principal
 do
 seu
 rendimento
. No
 caso
 das
 mulheres,
 o
 título de Rainha era-lhes atribuído após o enlace, necessitando os homens de engravidar a soberana para merecerem o título de Rei. Se por qualquer motivo essa função de procriador real ficasse por cumprir, pondo em causa a sobrevivência dinástica, teriam de se contentar com o estatuto de Príncipes consorte.
Há quase cinco anos que não dispomos duma Primeira-dama, rótulo dado abusivamente à esposa do Presidente da República em exercício ou com quem ele viva em união de facto. No próximo lustro também não teremos nenhuma ou talvez tenhamos de passar igualmente sem um abstruso Primeiro-cavalheiro, Valete, Joker ou como lhe queiramos chamar. Vistas bem as coisas e medindo-as pelo lado estritamente legal, nunca tivemos, não temos, nem nunca teremos um ou uma consorte presidencial com um título especial. É que no baralho de cartas da democracia plena, não há lugar para Primeiras-damas ou Primeiros-cavalheiros, a menos que esta nossa República se tenha transformado por artes de berliques e berloques numa Monarquia disfarçada, por ação de saudosistas impenitentes do anterior regime, extinto de vez há 110 anos.
Como o 
Gabinete do Cônjuge da Casa Civil da Presidência da República, que presta apoio à alegada Primeira-dama se encontra desativado desde março de 2016, pouco se sabe das atividades das suas ocupantes nos períodos de tempo que desempenharam 
pro bono este cargo não eletivo. Diz-me uma memória resistente à passagem do tempo e ávida de registar os eventos importantes da nossa
 História
 milenar,
 ter
 a
 última
 dita
 Primeira-dama
 que
 nos
 coube
 na rifa ocupado o tempo precioso que escasseava ao presidencial consorte a colecionar presépios, atividade meritória que lhe deve ter reservado
 por
 deferência
 especial
 um
 lugar
 de
 precedência
 protocolar
 no
 além, assim como o teve neste aquém legislado pelo Estado Português. É o mínimo que se poderia desejar a quem exerceu com tanto brio natalício tão honrosas funções.
c d
As eleições presidenciais portuguesas de 2021 estão à porta. Se tudo correr com a normalidade prevista, a primeira volta deverá decorrer num domingo situado entre 10 de janeiro e 14 de fevereiro. O Palácio Nacional de Belém terá novos inquilinos a partir do dia 9 de março. Terá ou manter-se-á o mesmo para mais um mandato. Se assim for, lá teremos de passar mais 5 anos sem a figura decorativa duma Primeira-dama de pacotilha, que nem por portas travessas será votada nas urnas eleitorais. Aquele espaço que já foi de reis e rainhas, príncipes e infantes, que já funcionou como residência privada duma dezena de presidentes da república, ficará reduzido às suas funções exclusivas de residência oficial do chefe de estado. Ás de copas, de espadas, de paus e de ouros. Único senhor dum cargo para o qual foi legalmente empossado.
 
Idiossincrasias que os homens semeiam ao longo de séculos de existência...
ResponderEliminare para as quais algumas mulheres colaboram ;-)
EliminarMuitíssimas mesmo...
EliminarUm às de copas está garantido ;-)
ResponderEliminarGostei de te ler.
Este "Baralho de cartas do poder" é uma pérola! Adoro o teu tom satírico e sublinho três segmentos verdadeiramente deliciosos: "...um lugar de precedência protocular no além "; "... exerceu com tanto brio natalício "; " ...figura decorativa duma Primeira - dama de pacotilha".
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