15 de abril de 2024

Huîtres creuses ou plates au naturel

Huîtres & Muscadet

Não sou apreciador de marisco a que um modismo recente começou a apelidar de frutos do mar. Frescuras. Nessa indiferença, excetuo os mexilhões preparados à maneira flamenga, as amêijoas cozinhadas numa cataplana algarvia e umas ostras bretãs comidas ao natural, como aliás é prática comum em todo o hexágono francês. Se no primeiro caso referido as batatas fritas são imprescindíveis e no segundo a polpa de tomate maduro, a cebola  cortada às rodelas e as fatias de pão caseiro fazem um trio inseparável para degustar os bivalves, o terceiro contenta-se com muito pouco, bastando-lhe uma simples vinaigrette para realçar o fino sabor iodado vindo do mar.

Num piquenique na Quinta do Marim, seguido dum giro pelo percurso de interpretação da natureza e por uma visita ao moinho de maré ali existentes, ouvi dizer a um técnico daquele Centro de Educação Ambiental terem as ostras portuguesas da Ria Formosa sido levadas para os parc à huîtres de Cancale para substituir as bretãs que entretanto tinham sido dizimados por um vírus. O mais curioso é que as netas, bisnetas ou tetranetas portuguesas viriam mais tarde a repovoar os viveiros portugueses quando o problema se verificou também entre nós. Não sei até que ponto a veracidade da história, mas parece-me mesmo assim digna de ser lembrada.

Algarvias ou bretãs, as portugaises continuam a ser das mais cotadas pelo exigente palato gaulês. Aprendi a degustá-las comme il faut em amena camaradagem com as creuses e as plates oriundas da baía do Mont Saint-Michele e degustadas em boa companhia em Saint-Malo. Voltei a fazê-lo muitas outras vezes em meses com/sem -R-, regadas com um bom muscadet frapé. As modernas técnicas postas ao dispor da gourmandise sanaram todos os riscos de as saborear tanto na primavera-verão como no outono-inverno. Tal como disse Fernando Pessoa sobre a Coca-Cola, primeiro estranha-se, depois entranha-se. Assim elas nos caiam no prato ainda a cheirar a mar.

MUSCADET

3 comentários:

  1. Nascida e criada numa ilha do Atlântico, não me habituei à moda das ostras cruas, por mais que as técnicas dos chefs lhes tente conferir ou salientar sabores. Para mim, estão cruas e não há como entranhar essa sensação terrível de algo esponjoso na boca, como se ainda estivesse vivo... Adoro todo o tipo de mariscos, como ilhoa que sou, mas não há nada como o sabor e textura das ostras grelhadas que a memória gustativa da mão cozinheira da minha mãe me legou, com o feliz sabor do limão.

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    1. Memórias cada vez mais distantes de Piqueniques pretéritos com vontade a cada momento de os repetir, voltar a sentir o gosto do mar chegar-me ao palato através das ostras degustadas ao natural. Grelhá-las ou dar-lhes qualquer tipo de cozedura não habita no meu imaginário, provavelmente por nunca o ter experimentado e não me sentir motivado para o fazer agora...

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  2. O meu pai não dispensava as ostras, na passagem de ano. Lembro-me, por isso, de as comer em crianças (no meu caso, abertas ao vapor, com limão e manteiga que derretia na concha). Lembro-me de que, a certa altura, deixaram de aparecer no mercado e de, em inícios da década de 80, ter ido a uma tasca que, alegadamente, era o único sítio, meio secreto, onde ainda se podia comer tal iguaria.
    Foi, segundo creio, a tasca que deu origem ao atual restaurante «A Fábrica».
    Dizia-se, na altura, que já não as conseguíamos encontrar no mercado, porque eram exportadas para França. Não sei se ouvi bem, se tinha les portugaises ensablées. E, tempos depois, comi, em Paris, ostras... portuguesas.

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