10 de abril de 2024

Os pomos de ouro ou da discórdia

Lord Leighton, The Garden of the Hesperides (1892)

HELÉNICAS, LATINAS & LUSITANAS
maçãs laranjas tomates marmelos melões

Dizem os mitos dum tempo sem tempo, que os tempos com tempo transformaram em lendas, haver nas margens do rio Oceano, onde o Sol se põe, um horto pejado de pomos de ouro plantadas por Hera no Jardim das Hespérides, a morada das ninfas defendida por um dragão com corpo de serpente munido duma centena de cabeças vigilantes. Apesar da agrura da tarefa, Héracles logrou eliminar o feroz monstro guardião e apoderar-se do cobiçado fruto.  

Dizem as lendas antigas, que os ditos recentes reduziram a histórias dum diz que diz sem fim à vista, referirem-se esses pomos dourados a lídimas MAÇÃS de ouro de poderes divinos prodigiosos. Associá-los, v.g., a Éris, à deusa grega da Discórdia. Esta, despeitada por não ter sido convidada para o casamento de Peleu e Tétis, encarregou Páris de entregar um desses frutos à mais bela das deusas, ponto de partida para a sangrenta Guerra de Troia.

Dizem as histórias atuais, com que o imaginário coletivo transfigurou os mitos e lendas ancestrais sobreviventes à voragem do tempo, serem as LARANJAS dadas como as maçãs douradas existentes nesse paraíso perdido à beira-mar plantado. O grego moderno até aponta para o nosso país, ao designar o citrino por πορτοκάλι [portokáli], imitado por uma diversidade doutros idiomas, pese embora o facto do cultivo ser relativamente recente entre nós.

Dizem por que o contramito da laranja mítica lusitana esbarra com a hipótese rival italiana de converter as maçãs douradas helénicas em TOMATES (pomodoros). Pomo da Discórdia nascido na antiguidade clássica, que se designa em latim uma «maçã doce» por melimellu, derivado grego de μελίμηλον [melimelon], para nomear o MARMELO, identificado à data com os seios divinos de Vénus/Afrodite, a deusa escolhida por Páris como a mais bela do Olimpo.

🍏🍎🍑🍅🍏🍎🍑🍅🍏🍎🍑🍅🍏🍎🍑🍅🍏🍎🍑🍅🍏🍎

Mitos e contramitos à parte, as histórias da História dizem-nos que urge achar os tais pomos de ouro sem discórdias à mistura. Maçãs, laranjas, tomates, marmelos. Tanto faz. Dadores do metal sonante amoedado com que se compram os MELÕES, amarelos por dentro e multicores por fora. Suculentos, saborosos, nutritivos. A provarem por a+b que nem tudo o que luz é ouro é como maçãs de ouro em salvas de prata enchem o olho e pouco mais.

3 comentários:

  1. Conjeturas douradas para tempos cinzentos, Prof! Nem os duendes ou elfos, se conseguissemos aprisioná-los, poderiam resolver a discórdia com um pote de ouro no fim do arco-íris... As laranjas não nos serão dadas, será mais um mito que já constatámos à partida. Discórdias haverá muitas, que os homens são peritos em produzi-las, tal como elfos que gostam de pregar partidas...

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. A Discórdia continua por aí com vontade de ficar até que a Harmonia resolva enxotá-la para outras paragens, dando a estes tempos cinzentos o dourado que tanto desejamos. Que as divindades olímpicas nos deem uma mãozinha, que o discernimento humano não dá para mais...

      Eliminar
  2. Teresa Salvado de Sousa11 de abril de 2024 às 12:17

    E assim temos, por obra e graça da mitologia, uma salada de frutas

    ResponderEliminar