10 de novembro de 2022

Oito ou Oitenta

REPOLHO & COVE-DE-BRUXELAS

O reinado mais longo e o governo mais curto da história da monarquia britânica acabam de ser contados neste verão-inverno de 2022. A rainha Isabel II desempenhou a soberania no Reino Unido durante 70 anos e 214 dias e a primeira-ministra Liz Truss somente 49 dias. Curiosas contrastes exemplificativos dum 8 ou 80 proverbial. Dizem os mass media encartados da aldeia global ter sido a mais longeva representante da Casa dos Windsor a cabeça coroada que durante mais tempo empunhou o cetro do poder a nível mundial. A mesma sorte não terá tido Lady Jane Grey, a sua antecessora da Casa dos Tudor, que só terá reinado de 10 a 19 de julho de 1553, ficando por isso conhecida como a Rainha dos Nove Dias.

Dizem os manuais especializados em datas e as listas cronológicas publicadas na Net ter ultrapassado os 72 anos e 110 dias que Luís XIV brilhou como Rei-Sol absoluto em Versailles e nos domínios da França e Navarra. O desaparecimento prematuro dos antecessores e a subida temporã ao trono está na origem destes casos extremos de chefia dum estado, depois concretizado com um extenso percurso de vida. Dom Sebastião de Portugal e Algarves poderia ter tido um destino semelhante, se os sonhos megalómanos de grandeza o não tivessem conduzido a Alcácer-Quibir onde morreu aos 24 anos de idade. Deteve mesmo assim os destinos dos reinos, senhorios e domínios herdados do avô 21 anos e 54 dias.

Filho de rei, rei será. Isto se for o primogénito ou sobreviver aos irmãos mais velhos. Dom Afonso Henriques nasceu infante e tomou a seu cargo a chefia do Condado Portucalense como príncipe entre as batalhas de São Mamede (1128) e de Ourique (1139). O facto de ser filho dum mero conde não lhe deu acesso imediato ao título de Rei. Teve de o conquistar pela força das armas, direito reconhecido pelo suserano leonês em Zamora (1143) e pelo Santa Sé na bula papal Manifestis Probatum (1179). Um longo percurso que permitiu ao primeiro soberano Casa de Borgonha tomar as rédeas do poder por 73 anos, 1 mês e 4 dias. Um record absoluto que os meios de comunicação social atuais calaram por completo.

Dom Carlos de Bragança reinou 18 anos e 105 dias e mais reinaria não fora o regicídio do primeiro de fevereiro de 1908. Ao que parece, Dom Luís Filipe ter-lhe-á sobrevivido 20 minutos. Rei morto, rei posto. O Príncipe Real não consta em nenhuma lista como Rei de Portugal. Faltou-lhe o ato da aclamação solene na Assembleia de Cortes, como o irmão acabaria por ter 3 meses e 5 dias mais tarde. Uma eternidade. Um tudo ou nada, em suma. Isso não impediu que nesses escassos minutos que sobreviveu ao pai não tivesse aos seus ombros o pesado fardo dos destinos do Reino. Histórias que os anais monárquicos colecionam nestas grandezas que vão dum enorme repolho a uma mera couve-de-bruxelas.

4 comentários:

  1. Interessante registo histórico, Prof! São realidades históricas que se vão perdendo pelo caminho, ou que se ignoram face ao fogo fátuo popular que se pretende alimentar...

    ResponderEliminar
  2. Bom dia, gostei de saber que o nosso D. Afonso Henrique reinou durante mais tempo do que a rainha Isabel II.
    Afinal ela não terá sido a recordista, pq será que se esqueceram do nosso rei?

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Histórias d'Arthur d'Algarbe12 de novembro de 2022 às 09:41

      Como sói dizer-se, a ignorância é muito atrevida, sobretudo quando nos pomos em bicos de pés perante a suserania secular que insistimos em manter face a tudo aquilo que cheire ao mundo anglo-saxónico...

      Eliminar
  3. Li com interesse a sua compilação de curiosos dados históricos, que desconhecia, e agradeço! Tinha na memória que Dom Sebastião tinha falecido com 28 anos e afinal foi com 24, que trágico!

    ResponderEliminar