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Jean-Auguste-Dominique Ingres Œdipe explique l'énigme du sphinx - 1808 |
ΟΙΔΙΠΟΥΣΤέκνα του Κάδμου του παλιού γενεά νέα, τι συναγμένοι κάθεσθε σ’ αυτούς τους τόπους, με τα κλαδιά της ικεσίας στεφανωμένοι; Και η πόλις είν’ από θυμιάματα γεμάτη, και αντιλαλεί από στεναγμούς κι από παιάνας; Αυτά εγώ απ’ το στόμα να μάθω θέλοντας, κι όχι απ’ το στόμα των μαντατοφόρων ο πολυφήμιστος ήλθα εδώ πέρα Οιδίπους. Λέγε μου ωστόσο γέροντα που σου ταιριάζει πρώτα απ’ τους άλλους να μιλής: η αιτία ποια να ’νε που ήλθατ’ εδώ στεφανωτοί με δάφνης κλώνους; Για ένα κακό που πάθατε ή μήπως γι’ άλλο που προσδοκάτε; πρόθυμος να σας βοηθήσω. Γιατί θενά ήμουν άσπλαχνος αν δεν λυπούμουν αξιολύπητους όπως εσάς ικέτας.
Repete a sabedoria popular milenar que Édipo matou o pai e casou com a mãe. Assim, nem mais nem menos, sem esclarecer muito bem a razão de tal insólito. Sigmund Freud encargou-se de clarificar essa dupla singularidade com a formulação do popular complexo centrado na figura do rei/tirano de Tebas, protagonista da tradição lendária grega antiga. Mais abrangente seria o saber do público ateniense contemporâneo dessas histórias pretéritas do que a dominada pelos espetadores/leitores atuais, a ponto de dispensar a menção a alguns eventos significativos ocorridos em data anterior aos representados no drama. Sabia, v.g., ter Laio raptado Crísipo, tendo por isso sido maldito por Pélops e punido por Zeus. O castigo seria executado pelo próprio filho do violador das leis da hospitalidade, que lhe tiraria acidentalmente a vida e desposaria a viúva. Todos os antecedentes causadores do desenlace funesto são de seguida revelados pelas falas ditas pelas vozes em cena no Prólogo, Párodo, Episódios, Estásimos e Êxodo, compostos por Sófocles no Rei Édipo (415 AEC), certamente a mais famosa tragédia ática que até nós chegou.
Às omissões já referidas, haverá que acrescentar os episódios que levaram à morte do velho tirano de Tebas e ao entronamento do novo, tal como do seu passado remoto e enlace com a rainha viúva. É que tanto o público dos festivais dionisíacos urbanos da primavera e dos leneus rurais de inverno, como das Paneteneias quadrienais, sabia perfeitamente que o protagonista havia sido abandonado à nascença, adotado pelos reis de Corinto e tirado fortuitamente a vida ao pai biológico numa rixa travada num cruzamento de caminhos estreitos da Beócia. A tragédia de Sófocles centra-se, precisamente, no processo de autognose de Édipo, determinado em esclarecer a razão da animosidade dos deuses para com a cidade que o escolhera como soberano, por ter decifrado o enigma da Esfinge e livrado a pólis de males maiores, e para as causas que haviam provocado a morte do seu antecessor por um malfeitor desconhecido.
A chave de todo o drama baseia-se na convicção helénica de que ninguém pode fugir à sua sorte. Nem sequer os deuses teriam a faculdade de exercer o livre-arbítrio, de fugir à inevitabilidade ditada pela ananke, a necessidade, força, compulsão, coação ou ordem natural, levada ao extremo da arrogância. O oráculo de Delfos, ao prever o destino do herói/anti-herói que empresta o nome ao drama, guiou em vão os verdadeiros pais a mandá-lo matar. Contra a sua vontade e à de todos os intervenientes na representação cénica dos factos acontecidos, o corifeu e coreutas na orquestra e os atores no proscénio, a liha de vida traçada mesmo antes de nascer acabaria por se cumprir em todos os seus pormenores. O parricídio seguido do incesto, ainda que inconscientes, teriam de seguir o seu trajeto tal e qual estavam predestinados desde a origem dos tempos.
A ironia trágica definidora do género distribui-se pela circunstância, algo absurda nos nossos dias, de serem os filhos a expiar os erros dos pais, de tomarem sobre os seus ombros a hybris pretérita dos genitores, propiciando, assim, a catarse purificadora de soberbas mil, descomedimentos e insolências de outrem. Édipo, o todo poderoso pés-furados de Tebas, submete-se às suas próprias leis, vazando os olhos que não tinham visto a realidade enquanto sãos e renunciando ao trono que lhe cabia por herança. Clarividência sábia difícil de repetir desde aí pelos detentores do poder. Nem sequer em sentido figurado. Estes ouvem os rumores sem fundamento documentado, comutam as dúvidas em certezas e derrubam os caídos em desgraça sem apelo nem agravo. Ignoram o exemplo do descendente de Laio e Jocasta, quando as suspeitas de favorecimentos alheios recaem sobre os seus ombros, demonstrando ser a inocência encarada de modos muito distintos, consoante as molduras conjunturais envolventes, a da honestidade ou a da prepotência. É que de facto, como diz a sabedoria popular, o pior cego é aquele que não quer ver.