La terre habitée : fleuves et rivières
Barthélemy l'Anglais, Le livre des propriétés des choses. 1479-1480
[Paris - BNF, Manuscrits - Fr 9140 f° 243v°]
«A questão da fronteira tem uma dupla dimensão, que se traduz na definição de um limite de vizinhança entre entidades diferenciadas e a que salvaguarda um espaço de intervenção autónoma de cada entidade em relação aos interesses próprios.»Adriano Moreira, «Prefácio» a Maria Regina Marchueta,O conceito de fronteira na época da mundialização (2002)
Há mil e uma maneiras de designar a noção de fronteira. É verdade que só arrolei uma dezena no título desta história, mas cada uma delas tem a capacidade de nos remeter para muitas outras de contagem final difícil de determinar. Para além das estruturais que limitam a longo prazo as estremas civilizacionais e culturais, teremos ainda de identificar as conjunturais mais instáveis a marcar quer as orlas políticas, marítimas, ideológicas, económicas, demográficas, cooperativos, quer as raias da cooperação, pobreza, conhecimento, espaço e tempo. Ultimamente, tem-se recorrido ao termo algo inquietante das lindes de segurança, divisas impostas pelo estado de emergência nacional à crise pandémica do COVID-19, causada pelo coronavírus SARS-CoV-2, ou de isolamento do país, que passa a estar circunscrito aos confins da sua área de residência.
O confinamento concelhio, quando se vive num município 0,7 maior do que Malta e 12,8 menor que o Luxemburgo, é como se vivesse entre dois dos mais pequenos estados em área da UE, sem me poder deslocar para mais parte nenhuma, como se vivesse num país cercado de inimigos da pior espécie ou insular em dia de tempestade. Em termos portugueses, é como estar situado no centro dum círculo cujo raio nunca ultrapassa em média a 1/2 dúzia de quilómetros, a separar a minha residência dos três conselhos limítrofes que a rodeiam. Estas restrições severas aconteceram entre as 23h00 de 27 de outubro e as 5h00 de 2 de dezembro, período de clausura que se está a repetir com o mesmo horário agora mesmo, de 4 a 9 deste derradeiro mês do ano. Dois fins de semana, duas pontes e dois feriados totalmente desperdiçados.
Fazendo o balanço da situação atual, sabemos que os restaurantes estão às moscas ou não chegam sequer a abrir, que os hotéis perderam clientes ou viram as reservas canceladas, que o comércio de proximidade ou das grandes superfícies sofreram prejuízos inéditos. Têm-se multiplicado as greves, falências, despedimentos, manifestações e mortes inglórias. O vírus por aí continua a andar. Imune a todos os confinamentos, ao distanciamento social e a toneladas de máscaras usadas no dia-a-dia. Resistem a tudo, quando a vacinação em massa está longe de acontecer e ninguém sabe muito bem a sua real eficácia. O Natal e o Ano Novo estão a chegar. Quem sabe se o Menino Jesus, o Pai Natal ou os Reis Magos nos trarão a cura milagrosa há tanto esperada. Só falta saber se nos temos portado à altura para merecemos tal benesse. Duvido.
Mas hoje está um lindo dia e da alegria que tal nos traz não há fronteira que nos separe. Que as máscaras e o afastamento físico, tão necessários, não nos afastem das pequenas coisas e dos reconfortos do dia a dia. Nos gloomy days económicos e mentais precisamos deles.
ResponderEliminarO dia está luminoso e até permite umas saídas até à varanda para aproveitar o sol. Fronteira restrita que permite observar a imensidade da cidade e do mar, mas limita um deslocamento até paisagens protegidas relativamente próximas mas confinadas pelas raias concelhias. Estremas necessárias dentro das suas marcas circunstanciais de duração indefinida.
EliminarImagino o quão complicado deve ser..
ResponderEliminarTema difícil, o do confinamento em tempos de pandemia... Na depressão económica que se instalou a partir de 2008, vi amigos de todas as idades perderem o seu emprego e filas de gente a pedir o pão para a boca frente a instituições públicas e privadas de solidariedade social. Mas nada comparado com o que vejo nestes dias, quando as filas são muito mais extensas e o emprego se tornou uma luta... Mas não queria estar na pele dos que têm de decidir as medidas de combate à pandemia, pois as experiências de há um século não perduraram no tempo. Tenho sorte porque as pessoas que me são mais próximas acautelam a disseminação do vírus ao cumprirem as regras que são indicadas pelos especialistas e sujeitam-se aos confinamentos em fins de semana e à organização familiar possível das festas natalícias e do fim de ano que se avizinham. Morreremos todos um dia, mas que não seja por descurar cuidados essenciais, tanto mais porque poderemos ter o azar de ter um organismo que sofra o vírus de forma violenta. Que os nossos responsáveis e os da dita união europeia saibam organizar a solidariedade social, enquanto nós tentamos ser cívicos e ter o bom senso que a pandemia exige, embora nos custe a prisão imposta.
ResponderEliminarHá prisões que libertam e esta será uma delas, muito embora o desconforto das medidas tomadas por esse mundo fora estejam mais do que justificadas. A criação deste novo tipo de estremas de segurança nos faça refletir sobre a impotência do ser humano sobre estas manifestações extremas que a natureza - a que está sujeito - de tempos a tempos o condiciona e confina à sua insignificância.
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