24 de agosto de 2015

Histórias de deus com palavras, cerejas & livros

Josefa de Óbidos - Cesta com cerejas, queijos e barros (1670/80)
The Quraysh seem to have found a rupture with the ancestral gods profoundly threatening and it would not be long before Muhammad's own life was imperiled. Western scholars have usually dated this rupture with the Quraysh to the possibly apocryphal incident of the Satanic Verses, which has become notorious since the tragic Salman Rushdie affair.
Karen Armstrong, A History of God (1993) 
As palavras são como as cerejas. Vão umas atrás das outras. Com os livros passa-se o mesmo. Pegamos num e aparecem logo outros à boleia. Farto de procurar os sentidos escondidos por Salman Rushdie n'Os versículos satânicos (1988), interrompi a releitura de verão ao romance maldito e parti à procura de ajuda nas fontes habituais da metalinguagem multicultural usadas em casos que tais.

Após algumas tentativas goradas pelos universos virtuais da netosfera, virei-me para a estante real de livros cá de casa. Dei com a Karen Armstrong a propor-me Uma história de Deus (1993) posta mesmo à frente dos meus olhos. Afinal a alegada blasfémia referia-se a um conjunto de versículos heréticos erradicados por Maomé do Alcorão, por lhe terem sido ditados por inspiração satânica.

O bestseller da ex-freira inglesa trouxe-me de novo à ideia que o ho-mem tem de deus, o nada que é tudo e o tudo que é nada. Enviou-me logo ao abri-lo para a religiosidade de infância de Stephen Dedalus em Dublin, posta em palavras por James Joyce no Retrato do artista quando jovem (1916). Leitura futura a mostrar que os livros são como as cerejas. Vêm sempre agarrados uns aos outros.

3 comentários:

  1. Curioso texto.
    Do Salman Rushdie li um conto numa das Grantas portuguesas, e gostei muito da sua forma de escrever. Também já li um pequeno ensaio de sua autoria numa das revistas Ler e também apreciei bastante. Romances, ainda não li nenhum, mas, sempre pensei que tinha que experimentar algum. Vejo pela sua reflexão que me espera tarefa árdua.
    Um dos aspetos que mais me agradou na leitura do "Retrato do artista quando jovem" do Joyce, foi precisamente o caminho do crescimento do personagem "Stephen Dedalus" relativamente à sua religiosidade, o ponto alto, e o seu declinio. Acho que são páginas extraordinárias do ponto de vista humano e literário.
    E sim, também concordo, as leituras possuem um fio condutor, que ás vezes se interrompe, mas, rápidamente se volta ao caminho que escolhemos seguir.

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    1. se gosta de Salmam Rushdie, leia também o Danúbio, que é a meu ver muito bom

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  2. Ando à procura do sentido estético dos «Versículos satânicos» do S. Rushdie desde o ano da sua publicação e ainda não a encontrei. Vou na terceira tentativa que deve terminar até ao final das férias. A polémica em que se viu envolvido continua a contaminar as minhas leituras. Sem a notícia das perseguições do fundamentalismo iraniano o livro teria passado perfeitamente despercebido na enxurrada de romances publicados todos os anos na aldeia global.
    Sobre o J. Joyce o grande entrave à leitura da sua obra deve-se à dificuldade que senti a entender os labirintos poéticos do «Ulisses», a tal obra-prima do séc. xx europeu. Espero que este «Retrato do artista quando jovem» seja mais fácil de entender. O anterior contacto com Stephen Dedalus já me terão preparado para uma incursão menos acidentada com o protagonista e anti-herói mais famoso de toda a literatura irlandesa contemporânea.

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