2 de junho de 2016

De amarelo se vestiram...

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MOZAICO DE AMARILLOS

Mauricio Lucioni Maristany - 2015

«-Sí. Cuando alcances mi edad habrás perdido casi por completo la vista. Verás el color amarillo y sombras y luces. No te preocupes. La ceguera gradual no es una cosa trágica. Es como un lento atardecer de verano.» 
Jorge Luis Borges, «El otro» IN El libro de arena (1975)
Os colégios privados deste país vestiram-se de amarelo neste início de primavera. Alguma razão terão tido para escolherem esta cor em particular. Desconheço-a por completo. Uma pesquisa rápida pelos dicionários de etimologias e símbolos esclareceu-me das origens e significados da palavra.

O vocábulo «amarelo» entrou no português pelo castelhano amarillo (= pálido), como diminutivo do latim amārus (= amargo). Segundo o filólogo catalão Joan Corominas, a associação de conceitos pode estar relacionada à palidez provocada pela icterícia, um distúrbio da bílis ou humor amargo.

O amarelo está ligado à luz, ao calor, à descontração, ao otimismo e à alegria. Simboliza o sol, o verão, a prosperidade, a felicidade. Dizem ser uma cor inspiradora que desperta a criatividade, propicia a reflexão e estimula o estudo. Em excesso, todavia, pode provocar distração e ansiedade.

Representa também a riqueza, o dinheiro, o ouro, de mãos dadas com o poder, a nobreza, o luxo. Estatuto mais chegado às tias e tios, meninos e meninas de papá e mamã que andam por aí de camisola amarela, sem terem vencido nenhuma etapa da volta a Portugal em bicicleta.

Cartão amarelo apresentado à tal geringonça defensora dum ensino público pintado de todas as cores do arco-íris. Amarelo de raiva de impérios caídos. Negociatas da China. Liberdade de escolher ao preço da uva mijona. Contas pagas com os frutos suculentos da árvore das patacas.

A vanglória de mandar contagiou pivots da TV, comentadores e figuras públicas com alguma visão mediática. Pintaram de amarelo-torrado o jornalismo cinzento que por aqui se faz. Esquecem-se que o astro-rei também encadeia, ofusca e cega quando fitado com arrogância e de frente.

4 comentários:

  1. Prof, sempre atento às questões sociais! Excelente a forma como salienta os contradições egocêntricas desta sociedade moribunda, onde a comunicação social representa bem o cancro que a rói. Infelizmente, está no grupo dos que mais ganham e mais querem sacar do Estado....

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  2. ".... a cegueira gradual não é uma coisa trágica,. É como um lento entardecer de verão."
    Só a introdução já me despertou para o belíssimo texto que escreve em seguida... Concordo em absoluto e, escrito desta maneira, só dá para ficar à esperta de mais... e mais...

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  3. O amarelo, uma cor que eu desconhecia ter tantos atributos associados! Dir-se-ia que tinha tudo para resultar, mas falhou (por excesso ?) - ou melhor, resultou, porque a vitória pesou para o lado da razão. Parabéns pelo magnífico texto, elogiado de forma tão brilhante por Maria Trovisqueira, a quem felicito também.

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  4. Gostei imenso de ler este texto, ao mesmo tempo sério e bem-humorado. Se se pode extrair algo de positivo deste problema, que seja a inspiração para opinar com graça.

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