Victor Arnautoff, City Life (1934) [Mural, Coit Tower, San Francisco] |
Papel, caneta & tinta
Nos meus verdes anos de menino e moço, escrevia ingenuamente aos embaixadores então creditados em Portugal bilhetes dos CTT, primorosamente caligrafados, a solicitar desdobráveis informativos sobre os países que representavam entre nós. E eles, ou alguém por eles, respondiam. Invariavelmente.
Argumentava-se então, nessas minimissivas decalcadas umas das outras, tratar-se duma mera recolha documental para as aulas de Geografia. Nalguns casos até seria, mas, nos restantes, o que valia mesmo era acumular um conjunto de pagelas coloridas e rivalizar em número com os colegas de escola.
Em papel especial se namorava à distância e em folhas A4 se escrevia aos amigos. A versão datilografada em teclado HCESAR nacional ou AZERTY internacional fazia-se a nível oficial. Depois tudo mudou de figura com o advento dos PC e do correio eletrónico enviado ao ritmo dum simples clique.
No tempo em que ainda se redigiam cartas e postais ou se enviava um telegrama de vez em quando com as palavras bem contadas, a vida corria placidamente à espera duma mensagem de resposta. E as escritas manuscritas repetiam-se dia após dia sem variantes de permeio. Caneta, tinta, mata-borrão, selos.
Nessa época analógica em que ainda não existiam ou se suspeitava que alguma vez viessem a existir os atuais e corriqueiros e-mails, SMS, Messenger, WhatsApp e o diabo a sete virtual on-line, a espera impaciente da volta do correio era um garante seguro de que a vida se fazia num vaivém continuado de ir e vir.
Nesta era de digitalizações galopantes, dou comigo incapaz de ler a minha letra escrita à mão há menos dum nada. Com uma breve busca na Net, todos os dados obtidos dispensam os bons ofícios dum mero embaixador da nossa praça. Parafraseando Shakespeare, admirável mundo novo que tais maravilhas nos dá.