12 de julho de 2019

Os nós emblemáticos dos Bragança

Porta dos Nós - Vila Viçosa
     Depois de Vós, Nós    


Quando em 1498 D. Manuel I se deslocou a Toledo com D. Isabel, para assumirem conjuntamente o Principado das Astúrias e a sucessão dos Reis Católicos, o Afortunado nomeou o sobrinho D. Jaime herdeiro do trono. Em sinal de reconhecimento, o jovem duque escolheu para emblema da Sereníssima Casa de Bragança, reabilitada nesse mesmo ano, a figura do «Nó» e o lema do «Depois de Vós», como corpo e alma da divisa. A honraria seria de curta duração, dado que pouco depois nasceria em Saragoça o Príncipe D. Miguel da Paz, jurado pelas respetivas Cortes como futuro monarca das Coroas de Portugal, Castela e Aragão.

A emblemática criada pelo quarto titular da mais importante família nobre do reino seria ampliada pelo sexto, quando transformou a primitiva letra do mote em «Depois de Vós, Nós». Queria o Duque D. João I significar que logo a seguir aos Avis estavam os Bragança na linha de subida ao trono. O desaparecimento de D. Sebastião em Alcácer Quibir e a crise dinástica que se seguiu, colocava a mulher, a Infanta D. Catarina, como principal candidata à coroa deixada vaga pelo Cardeal-Rei D. Henrique. A força da razão dos Bragança acabou por ser derrotada pela força das armas dos Áustria, representados por Filipe II de Castela e I de Portugal.   

A simbólica dos «Nós» adquiriu nova dimensão, quando o oitavo duque é aclamado rei como D. João IV de Portugal. O górdio frígio que unia a Monarquia Dual é desfeito com o advento da dinastia de Bragança, evento devidamente representado no cordame cortado, alegoricamente esculpido em pedra na Porta dos Nós, que o novo soberano manda erigir como padrão comemorativo nas muralhas de Vila Viçosa. Razão tinha o descendente do Mestre de Avis e do Condestável do Reino, qual outro Alexandre Magno dos tempos modernos, de se considerar liberto das amarras hispânicas e de partir à reconquista dum mundo que lhe pertencia de direito.

Doravante, o título ducal passou a ser atribuído exclusivamente ao herdeiro presuntivo do trono, continuando a dar sentido às palavras contidas na sentença escolhida várias gerações para caraterizar a família. Depois de «Vós» (o Rei), «Nós» (o Príncipe), garante da per-petuidade exigida pela legitimidade dinástica. Foi o que aconteceu com o Rei-Imperador D. Pedro IV de Portugal e I do Brasil, após a abdicação sucessiva da coroa real portuguesa e da imperial brasileira. Reassumiu-se como Duque de Bragança e colocou-se na cadeia sucessória imediata à da filha, a Rainha D. Maria II da Glória, menor de idade, solteira e sem descendência direta.

Ignoro qual o sentido dado pelos atuais pretendentes à dignidade de Rei de Portugal e Duque de Bragança, depois das leis da República terem abolido de vez a Monarquia e toda a titularia nobiliária de privilégios aristocráticos a ela associada. Curiosa será a interpretação que D. Manuel II lhe deu, ao conceber o seu ex-líbris pessoal de bibliófilo consagrado: as Armas Reais e a Esfera Armilar de D. Manuel I associadas às «cordas com nós» e ao «Depois de Vós, Nós». Isto é, após o Venturoso senhor de meio mundo, o Desventuroso senhor de nada e coisa nenhuma. Iguais no nome, diferentes no destino. Divisa-epitáfio dum rei deposto sem sucessor à vista.
Ex-líbris de D. Manuel II

1 comentário:

  1. Interessantes histórias dinásticas que estão guardadas no seio da riquíssiam história de Portugal!

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