Josefa de Óbidos A leitura da sina do Menino Jesus - 1667 [Coleção Jaime Eguiguren Art & Antiques] |
Quando o presépio ainda era uma presença indispensável na sala de jantar, o musgo era borrifado todos os dias para cheirar a terra molhada e as pratas dos chocolates comidos durante o ano imitavam à perfeição as águas cristalinas dos rios e dos lagos palestinos de Belém de Nazaré.
Quando a árvore de natal era relegada para segundo plano, o abeto escandinavo era substituído pelo pinheiro-manso mediterrânico, os bugalhos pintados substituíam as bolas de vidro decorativas e uns tufos de algodão-em-rama faziam as vezes dos obrigatórios flocos de neve setentrionais.
Quando uma filhó parecia um pintainho no imaginário criativo da minha avó, a noite da consoada reunia-nos à volta da mesa da cozinha à espera que a noite fosse rápida e manhã chegasse célere para ver os presentes que o Menino Jesus deixara no sapatinho posto na chaminé.
Quando as fitas, os laçarotes e os papéis de embrulhar as prendas se guardavam religiosamente duns anos para os outros, os cartões ilustrados alusivos à época desejar aos amigos e familiares umas boas-festas e feliz ano novo ainda eram escritos à mão e recebidos com todo o prazer.
Quando o bolo-rei trazia uma fava numa fatia e um brinde noutra a obrigar quem as encontrasse a pagar o próximo doce festivo ou a ser brindado com a boa sorte, o pai natal era ainda uma figura pouco mais do que desconhecida e os três reis magos ainda eram tratados como devido.
Quando o mês de dezembro se adentra, os motivos do barroco seis-centista, pintados pela Josefa de Ayala em Óbidos, fazem-me lembrar os natais da minha infância, aqueles em que o maravilhoso cristão estava vivo e ainda acreditava piamente na vinda anual dum deus menino renascido.
Reminiscências que a época traz à memória com grande nostalgia... Costumes que nos foram comuns, numa época em que o consumo era moderado e a reutilização uma realidade usual. Mas relembrar é reviver, pelo que os cheiros e sabores da infância estarão presentes com prazer nestes dias festivos, acentuados pelo degustar dos doces natalícios!
ResponderEliminarOs anos e décadas passam e as reminiscências nostálgicas da infância crescem de intensidade, sobretudo em momentos menos bons como os que nos envolvem nos dias de hoje. As palavras vêm-nos à memória e por vezes passam para um registo escrito no papel ou no espaço virtual. Sinais dos tempos que os aromas do natal nos vão acentuando...
EliminarTal e qual!
ResponderEliminarCom algumas nuances, poucochinhas diferenças, eram assim os nossos natais...
Tão isto! Fizeste-me lembrar toda a preparação, toda a atmosfera da época, desde a ida ao musgo, que tinha de ser bem verde e aveludado (ainda não sabíamos que retirá-lo ameaça o equilíbrio ecológico) à escrita atempada dos postais de boas festas que se tinham comprado na papelaria do bairro. Já quase tinha esquecido a elaboração dos riachos ondeantes com as pratinhas dos chocolates. Obrigada por esta memória, como sempre tão bem evocada e tão bem escrita!
ResponderEliminarOs meus natais eram também assim. o meu musgo era apanhado entre as pedras do passeio e no telhado. E ia à fábrica de cortiça pedir uns bocados para fazer a gruta e os montes.
ResponderEliminarTal e qual as minhas memórias.
ResponderEliminarAinda mantenho o Presépio, com todos esses "condimentos" que descreveu.
Que lindas cores e perfeição Josefa d'Óbidos emprestou ao Presépio.